domingo, 13 de setembro de 2020

o rastro

o contorno do meu corpo marcando a grama
por pouco tempo depois de tirar dali o peso
e dar espaço para insetos ali rastejantes:
o movimento enfim livre: é a mesma leveza
de quando me levanto do teu corpo macio
que há tanto desejo
e espero em silêncio
é com a mesma ligeireza da grama quando
me levanto que perde teu corpo suado
o calor que de contínuo emano
do meu e a breve lembrança não dura
mais que alguns suaves suspiros cansados

já é dia e há tantos dias que nossos corpos não
marcam um no outro brevemente nossos
contornos imaginados, e um corpo se confunde
enfim com outro como que atravessando o tempo
— no mesmo espaço-tempo-caixa de memórias —
nos fazendo confrontar o impossível:
dois corpos que ocupam sem medo
o mesmo espaço-suspiro
mas raia o dia pela janela de vidro
e concreto: nossos olhos marejados de cansaço
a caçar o calor da noite: em que braços?
e há dias em que o dia amanhece em silêncio
nem mesmo o canto dos pássaros: - - -

da reminiscência de quão breve é o voo
do meu corpo sob o teu: sobra o meu
silêncio em ninho a fazer-se miúdo
e vê na janela o desenho úmido
de teus dedos tímidos
num adeus
que é quase
surdo

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