segunda-feira, 29 de maio de 2023

para me conhecer o cheiro
precisa estar perto o suficiente
para me tocar a pele quente e macia
conhecer-lhe a textura e a umidade
estar com disposição para o desenho
das minhas unhas nas suas costas
impregnando-as de pele morta e suor
ou para se deixar rasgar lentamente
pelos meus dentes, bem na ponta
das presas se deixar ser presa
e como todo bom predador
para isso é preciso
que te conheça o cheiro

terça-feira, 23 de maio de 2023

o amor esta pedra
imensa sobre as costas
a colina em subida
pedregosa e escorregadia
ainda que seca e porosa
qualquer pé vacilaria
mas se te olho
por um instante
me imagino
o próprio sísifo

domingo, 21 de maio de 2023

colmeia

é preciso imaginar a rainha
não como mais uma abelha
ou a mais abelha entre as apis
rainha, regente das operárias
é preciso pensar a rainha
não como abelha mas como
ideia, como o que nos move
o hexágono

quinta-feira, 18 de maio de 2023

meu pai
nunca amou
nos bater
nem pediu
pra escolher
o cinto melhor
pra me bater
ou pra subir
na árvore
em frente
da nossa casa
e pegar o galho
mais verde
flexível
vital
pra me bater
nunca quis
ver a geografia
do laço
no meu corpo
de menina
levada
língua solta
não parou
pra observar
com orgulho
os vergões
nas costas
e nas coxas
as gotículas
de sangue
no canvas
da minha pele
nunca apoiou
a educação
pelo laço
e até hoje
acha horrível
que batam
em crianças
e jamais faria
isso com seus netos
com nós filhos
sim
o fez
tudo por amor
a você,
mamãe

segunda-feira, 15 de maio de 2023

porque ouço o canto das baleias
sei que algo não vai bem
essa agitação na superfície
como crianças que brincam
num parque aquático
num domingo muito quente
um balé oceânico
azul e cinza enquanto
as ondas se quebram brancas
contra as suas costas
vem desde as profundezas
do terreno mítico
areia primeira da vida
a inundação já nos alcança os pés
e o mundo se faz útero
nos encapsulando
as cachalotes gritam:
algo novo e terrível está por vir

quando ao fim paro e te olho
enfim vejo que encerramos o voo
o vento bate e agita as tuas penas
que respondem também ao sol
não me cegas e eu enfim te olho
finalmente: tu inteiro
o teu bico e os teus olhos inteligentes
todas as tuas penas que sob os meus pés
fazem uma cama emplumada
perfeita pra queda
finalmente te olho e estás inteiro
: reluzente e certeiro
e enfim te amo
te bico a cabeça
e te arranco penas
abres tuas enormes asas
e és quase toda a paisagem
como num tango
deslizamos pelo rochedo
o mundo inteiro nos cerca
e todas as montanhas são testemunhas
mas terminado o espetáculo
sincero do nosso amor
me olhas como uma flecha
expande ainda mais as tuas asas reais
alças o voo
como que tem o céu na ponta das garras
e pequenininha te assisto conquistar o imenso
com as minhas asas quebradas
no rochedo
por fim macio

twinky goes into a relationship
mas mama no sigilo his twinkier bf
asks his girlfriend to be faithful and a doll
except in bed where she gets to be a whore
is the twinkier a whore in bed too you may ask,
well of course not!
good men are not whore
they get to know everything

quinta-feira, 4 de maio de 2023

pensei num poema ruim
minha cabeça é assim
malho o corpo
as ideias suam
como que afloram
em plástico
old que vou escrever
não posso me esquecer
os tempos mudaram
eles são ah uma mudança
que tempos são estes
assistimos lentamente
devagar devagar o bebê
cósmico assiste num instante
a tudo: de passar o rodo
tão jovens e mundanas
hoje tão tão piores
só passamos pano
não se trata de gênero
mas sabemos que panela velha
é que faz rima boa
e aqui não temos os instrumentos
para que mulheres trabalhem

quarta-feira, 3 de maio de 2023

a academia era o último lugar
em que esperava encontrar,
com corpos suados
pulsantes em movimento
tão vivos e arfantes,
o fantasma de ti
me olhas de esguelha
e eu corro tranquila
não creio em meus olhos
cansados nesse ambiente
tão iluminado
daqui tudo se vê
estás sentado
e tudo está errado
trabalhas costas mas essas mãos
jamais me seguraram o rosto
enquanto me beijavas sereno
o que houve com teus cabelos
sempre tão lindos e sedosos
agora não passam de uns fios
sebosos de corpo há muito enterrado
e quando me olhas de esguelha não sabes
se me reconheces ou não
se já me esquecestes
vejo que finalmente trocastes
teus óculos cansados
então é claro que não me vês
estranho teu perfil
tua barba feita assim
enfim te viras por completo
caminhas na mesma direção que a minha
e corro mais rápido
noto que com certeza
não é tu, ali
em carne e osso e suor
aquele rosto tão comumente largo
sem a elegância e a harmonia
do teu, tão fino e alongado pela barba
com destaque ao teu nariz
que já é grande
assim sei que não me farejas
porque não é tu, ali
de camisa branca
que sempre te caiu tão bem
e agora mais parece um trapo lavado
num corpo menos cansado que o teu
de tênis, e tu jamais usaria esses tênis
mas não creio em meus olhos suados
então corro mais rápido
que é pra ver se te alcanço
enquanto te fujo
mas não é tu, ali
se ao menos meus olhos não me traíssem
e já meus pés não me alcançam
gasto a máquina
paro os batimentos
estatelada no chão
fluindo pra todo lado
tenho certeza
de estar viva
mas tu, ali, não

na minha cidade há uma rua em que os carros param e parecem à beira do abismo esperam o semáforo e dali pra frente é só pra baixo rumo ao ho...