sou maremoto, maremansa
a vida, esta dança
tira-me os sapatos
as couraças
e aos pouquinhos
faz-me sapatear

uma floresta é muita
coisa mas não é
silenciosa
e assim
ensina
que o silêncio
pode ser
o fim de tudo
até
da destruição

it's a world of boring blondy babies

de helenas
de manoeis carlos
chatas
de galocha
protegidas contra a chuva
o vento as poças de lama
contra tudo que não é
o espelho límpido de seus
olhos vazios
meninas de trinta anos
agarradas a uma ideal
garotinha de cachos dourados
que procura no mundo cores
e sons mas nada muito longe
das paredes de casa
do quarto de mamãe
e principalmente
das mãos de papai

de mariazinhas
vindas lá não sei de onde
sofridas
de todo tipo de invenção
que lhes renda um pouco de atenção
meninas que falam com outras
meninas de quase trinta anos
sobre serem meninas
e quererem um mundinho lindo
cheio de menininhas
lindinhas como elas
que falam e escrevem tudo
em tons de bege e emojis
de coração branco e brilhinho
que encontram no mínimo
todo dia algo que é o máximo
e revelam seu lado íntimo
sua criança interior

exterior criança
criança única
menininha linda
não há ninguém
como você
menininhas da infância
na vida adulta
não há ninguém
como vocês

e é bom beijá-las e lambê-las
e lambuzar os beiços com seu sebo
e passar entre os dentes sujos
seus belos cabelos imaculados
e é bom mastigá-las bem hidratadinhas
no meio da tarde larga
pra matar um pouco de tempo
viajando a infâncias nunca vividas
registros em fotografias posadas
bem lindinhas com seus sorrisos
e suas caretinhas brabas
essas menininhas meigas
bela barbiezinha e sua prima
menos adorável ainda
que mais arredondada
a bela susie

ó doces garotinhas

como é bom comê-las
arrancar suas cabecinhas ocas
e cortar-lhes o cabelo fraco

te amo por
não pensar mais em mim
te amo por
não sentir a minha falta
nem me dizer que ainda me quer
te amo por
caminhar pelas ruas dessa cidade despreocupadamente
e não temer esbarrar em mim a cada esquina loja restaurante
a que nunca fomos e eu não frequento
te amo por
não ter me transformado no fantasma que és
te amo por
favor vê se me deixa em paz

hoje sonhei contigo outra vez

nos abraçávamos forte e éramos nós também muito fortes e carinhosos, conscientes do que convencionei chamar de inevitável fim para me sentir menos como alguém que perdeu um membro do corpo. conscientes de não estarmos mais juntos, ainda que naquele abraço sentisse todo o teu corpo e teu cheiro e até teu gosto teu riso e a textura dos teus cabelos nos meus braços. me beijavas o rosto e eu fazia uns grunhidos de quem te ama. infantilmente. docemente. imaturamente. como fruta que cai do pé por acaso e não por natureza. como. como, me arrependo de tudo. não há mais pêssegos. não há mais constelações, cometas, o som da tua voz e o calor das tuas mãos magras no meu corpo arrepiado de ti. sonhei e não quis acordar. sonhei e não quis, mas acordei. que horror a realidade e essa falta metáforas.