domingo, 23 de fevereiro de 2020

non ce ne posse pazzá

no meio do nada
numa cidadezinha
onde quem mora?
um arco romano
faz-nos ver: nada
abre-se como quem?
vê-se só sem nada
para proteger, como
mãe que dá leite
sem ter filhos.
um arco em tijolos
tipicamente romanos
em pleno dia de hoje
como quem sobrevive
mas não se lembra
exatamente o porquê

domingo, 16 de fevereiro de 2020

binario sbaiato

lê um livro
cujo título luto
pra ler
como quem tem livre
a noite já passada e vê
no trem um ponto
de partida (ida)
a linha até aqui seguida como
o que resta da onda do mar
na areia
no trem
como quem tem tempo
pra matar
todo o trajeto feito
longe do mar (volta)
o lápis vermelho (teu)
verde (eu)
o branco dos bancos
rabiscam um país così lontano
a linha do mar
a sua graça
é continuar a desenhar-se
movimentar os grãos do que
um dia foi pedra e concha e vida
e fazer parecer que assim
naturalmente
é que se rabisca uma linha
contínua

terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

chuva de verão na cidade

homens empoleirados
como pombas sem voo
em dia de chuva
torrencial
aninhados contra a parede
de concreto frio úmido
que descasca cansado
pela rotina debaixo do sol

domingo, 2 de fevereiro de 2020

(lendo ana martins marques)
i.
longe do mar
há o que se pensar
?
pois se os herois
eles vêm mesmo quase
sempre de algum mar
vêm por entre ondas e
nuvens, por entre raios
de sol e trovoadas
revelam: em si
a natureza enquanto força

um profeta, entretanto
quase sempre vem das montanhas
isto é
um homem surge entre os morros
caminha entre cabras e vacas
esfrega as mãos em arbustos
pelo caminho
vem e traz algo de maravilhoso
algumas palavras, já
pronunciadas antes?
traz uma metáfora
a distância que apaga
e revela
o poder da palavra
absurda
como a dimensão
de uma montanha

ii.
o que pensam as pessoas
que vivem longe do mar
ou
que não conhecem
o mar
onde há a imensidão
o inifito em sua possibilidade
a vastidão jamais conhecida
?

;

no topo da montanha
passeia uma cabra entre
as árvores, e o vento
que anuncia mudança
de tempo
no topo da montanha
os últimos raios do dia
que continua

iii.
mas veja
há ainda
uma pequena ilha
em cujo céu uma revoada
de pássaros alinhados em v
delineiam o traço imperceptível
o desenho inconcebível do infinito
em que montanha e mar revelam-se
contínuos

na minha cidade há uma rua em que os carros param e parecem à beira do abismo esperam o semáforo e dali pra frente é só pra baixo rumo ao ho...