sábado, 9 de março de 2024

corpo a corpo

tomar a tua mão seria
totalmente vulgar
tenho a tua distância
trato de dar tempo
ao ritual do toque
encosto na tua mão
entendo que não é minha
ainda e aos poucos me revolto
me revolvo ao teu redor
teus olhos sofisticado
redemoinho de desejo
te tomo inteiro sob meus braços
te derrubo e te cubro
com o meu corpo seminu
e quente
nossos dedos se entranham
agarro a tua pele macia
sinto os teus músculos tensionados
todo o teu corpo duro
cheiro o teu suor e o teu prazer
me debruço sobre ti enfim
te conquisto
e me entrego

assisto a dança do desejo
nos olhos atentos
e nos joelhos
dos gatos
antes de caçarem sua presa

como o tempo passa lento
quando o
contamos

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

da janela do ônibus
a lua laranja me ilumina
a pele banhada de amor
e saudade pela estrada

da janela do ônibus
a vida se descortina
entre água e montanha

sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

o mundo desta formiga
infinitamente maior
e mais antigo
que o meu
é de areia
sal e cascalho

sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

"não é o fim do mundo,
só do universo"

para A. em ocasião da sua partida

daqui a alguns trilhões de anos, quando o tempo não fizer mais sentido e a última anã branca sozinha estiver estabelecendo tudo o que ainda não conhecemos, nada disso vai importar mais.

mas enquanto sei a diferença temporal entre uma onda e uma montanha, trato como sendo da maior importância.

precisamente pela raridade de reencontrar um amor e vivê-lo em sua pureza.

por desatar nós e finalmente
saber dizer que te amo.

contigo longe, ainda vou comer na nossa pizzaria e a pizza continuará saborosa. saborosíssima. moradores de rua em busca de um trocado pra pinga e pra droga virão falar comigo diretamente. e eu vou pensar em ti esboçando um sorrisinho cheio de saudade.

tu, também, vais ter a audácia de continuar rindo gostoso. vais te deitar em outras camas e amar outros gatos.

a lembrança da tua pele e da tua risada serão raios do teu sol nos meus dias chuvosos. e eu vou ter que te buscar na memória, lembrar de como rio contigo e da calmaria do teu abraço, onde me torno fluida — rio, mar, lágrima, suor e gozo.

no auge do teu atrevimento, vais levar de mim uns escombros de amor.

e tudo vai passar, erodindo a memória.

mas daqui, vendo a onda se formar gigante, meu desejo é que ela não quebre nunca. que se torne montanha. que por alguns trilhões de anos a gente fique nessa beira de praia sentindo o sal na pele. porque, quando aquela última estrela renovar o universo, algo de nós ainda vai estar lá. pronto pra rebentar.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

um último de amor

 para M. na ocasião de seus 35 anos

é um nó que me ata os dedos
instrumentos da minha atual comunicação
no dia de celebrar iansã teu corpo todo se faz festa
território encantado dos teus segredos
meus dedos te percorreriam feito pés de samba descalço
acariciariam teus pelos (minhas matas) tuas têmporas
perdi o tempo de fazê-lo
atada como estou
inútil explicar a qualquer um
como sou capaz de desatar-me aqui
como escrevo-te sem ser para ti
que não me lês e mal sabes como estou
como te escrevo buscando-te na memória
tentando te celebrar neste espaço que criei
só para ti: um átimo de amor
mas é um nó o trago que me entala a garganta
não há mais estações de águas a arrebentá-lo
teu corpo então se tornou território sagrado
que meus dedos imundos não festejam mais
que minhas lágrimas salgadíssimas não banham mais
teus pés tuas mãos teus dedos livres não beijo mais
no ar que entra pela tua janela um cheiro salino de mar te alcança
: minhas tempestades a te desejar calmaria
finalmente a calmaria
único presente que pude te dar

domingo, 26 de novembro de 2023

para alda

à beira do mar
os pés afundam na areia
mulher-escultura das ondas
corpo-festa da vida micro
assim o mínimo
se faz imenso

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

¿Qué sabe un forastero sobre tomar un buen mate?
Nadie le dijo cómo se ceba: si amargo o untado en miel,
hojitas de cedrón o cáscaras de naranja.
Que el agua no se deja hervir,
que amaina el apetito y sosiega la mente.
¿Qué pienso? Quizá me complazca
y un día me instale con mi bombilla
en la arena movediza de la yerba.

 

O que sabe um forasteiro sobre tomar um bom mate?
Ninguém lhe disse como se prepara: se amargo ou untado de mel,
folhinhas de lúcia-lima ou cascas de laranja.
Que a água não se ferve,
que acalma o apetite e sossega a mente.
O que eu acho? Quem sabe me agrade
e um dia me instale com a minha bombinha
na areia movediça da erva.

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

como se diz tchau
para uma tartaruga?
há um movimento
de mão
de corpo
de voz
que ela entenda?
há algo que a faça
entender que a vida
aqui fora me
exige que eu vá?
acima de tudo
a chuva me exige
a retirada
a pele assim
desprotegida assim
sem casco enfim
fora do lago
eu macaquinha
morangos na mão
a tartaruguinha
furtivamente vai roubar
assim que eu sair
então deixo mais um
um pequeno banquete
para que ela entenda
aquele morango
todo vermelhinho
doce cheio de sementes
é meu coração
o pedaço de amizade
que posso lhe deixar
enquanto a vida
com v minúsculo
me leva na enxurrada

corpo a corpo

tomar a tua mão seria totalmente vulgar tenho a tua distância trato de dar tempo ao ritual do toque encosto na tua mão entendo que não é min...