sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

o mundo desta formiga
infinitamente maior
e mais antigo
que o meu
é de areia
sal e cascalho

sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

"não é o fim do mundo,
só do universo"

para A. em ocasião da sua partida

daqui a alguns trilhões de anos, quando o tempo não fizer mais sentido e a última anã branca sozinha estiver estabelecendo tudo o que ainda não conhecemos, nada disso vai importar mais.

mas enquanto sei a diferença temporal entre uma onda e uma montanha, trato como sendo da maior importância.

precisamente pela raridade de reencontrar um amor e vivê-lo em sua pureza.

por desatar nós e finalmente
saber dizer que te amo.

contigo longe, ainda vou comer na nossa pizzaria e a pizza continuará saborosa. saborosíssima. moradores de rua em busca de um trocado pra pinga e pra droga virão falar comigo diretamente. e eu vou pensar em ti esboçando um sorrisinho cheio de saudade.

tu, também, vais ter a audácia de continuar rindo gostoso. vais te deitar em outras camas e amar outros gatos.

a lembrança da tua pele e da tua risada serão raios do teu sol nos meus dias chuvosos. e eu vou ter que te buscar na memória, lembrar de como rio contigo e da calmaria do teu abraço, onde me torno fluida — rio, mar, lágrima, suor e gozo.

no auge do teu atrevimento, vais levar de mim uns escombros de amor.

e tudo vai passar, erodindo a memória.

mas daqui, vendo a onda se formar gigante, meu desejo é que ela não quebre nunca. que se torne montanha. que por alguns trilhões de anos a gente fique nessa beira de praia sentindo o sal na pele. porque, quando aquela última estrela renovar o universo, algo de nós ainda vai estar lá. pronto pra rebentar.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

um último de amor

 para M. na ocasião de seus 35 anos

é um nó que me ata os dedos
instrumentos da minha atual comunicação
no dia de celebrar iansã teu corpo todo se faz festa
território encantado dos teus segredos
meus dedos te percorreriam feito pés de samba descalço
acariciariam teus pelos (minhas matas) tuas têmporas
perdi o tempo de fazê-lo
atada como estou
inútil explicar a qualquer um
como sou capaz de desatar-me aqui
como escrevo-te sem ser para ti
que não me lês e mal sabes como estou
como te escrevo buscando-te na memória
tentando te celebrar neste espaço que criei
só para ti: um átimo de amor
mas é um nó o trago que me entala a garganta
não há mais estações de águas a arrebentá-lo
teu corpo então se tornou território sagrado
que meus dedos imundos não festejam mais
que minhas lágrimas salgadíssimas não banham mais
teus pés tuas mãos teus dedos livres não beijo mais
no ar que entra pela tua janela um cheiro salino de mar te alcança
: minhas tempestades a te desejar calmaria
finalmente a calmaria
único presente que pude te dar

na minha cidade há uma rua em que os carros param e parecem à beira do abismo esperam o semáforo e dali pra frente é só pra baixo rumo ao ho...