quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

a tua janela que há tanto não olho me olha
duros anos os que marcaram o espanto
com que a olhava a te procurar de esguelha
ou o teu gato marcando encanto na rua vazia
o sol a pino não sei se me cega a lembrança
do teu gesto ou o reflexo na janela de onde vivias
com a tua família e eu sempre a vagar pela vizinhança
vago ainda feito oferenda a iemanjá dia primeiro
e me lembro dos nossos pés fincados era janeiro
a praia vazia de tudo ecoava a minha voz e o teu
olhar sereno de quem pouco pouco me suporta
- e ama, não me dizes nunca, mas, como poucos, amas -
aperto o olhar e diminuo o passo pra ver se sou eu
quem falta na janela uma mão que bate à tua porta
(vacila a memória: é fictícia: eletrônico, o portão)
a tua janela hoje: aluga-se; a placa, a janela - é uma porta
fechada fechada
eu passo como quem não quer nada
e quase me atropela um caminhão
as sacolas vazias: não há mais rimas

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